terça-feira, 22 de janeiro de 2013

“Reprovação próxima a 80%”

Como os leitores da Folha de São Paulo sabem, o caderno Cotidiano exibe diariamente a primeira página do jornal de cinqüenta anos atrás e um resumo da noticia referente à manchete daquele dia.

Veja a do dia 5 de janeiro de 1963:
“Reprovações em massa: sugere o governo alterações na 2ª época”. E o resumo informa que “Algumas instituições de ensino registraram taxas de reprovação próximas a 80% no ano passado. A elevação coincide com a implantação da Lei de Diretrizes e Bases, em junho de 1962, que estipulou em dois o número máximo de matérias para a 2ª época e subiu a nota média de 4 para 5.” E o resumo continuava: “Visando reduzir o índice, o documento (...) propõe que o aluno possa carregar para a recuperação até quatro disciplinas”.

Veja a do dia 5 de janeiro de 2013 (Cotidiano):
“Pelo terceiro ano, desempenho de aluno em matemática recua”. O texto informa: “O desempenho em matemática dos alunos que se formam nas escolas municipais de São Paulo sofreu ano passado a terceira piora seguida na avaliação da própria rede. Assim, o estudante da nona série do ensino fundamental (...) possui conhecimento equivalente ao que se espera para um da quinta série (...)”. Mais adiante, há a notícia de que a nova gestão municipal (posse em 1º de janeiro) “(...) aponta como uma das metas na educação fazer com que as avaliações sejam mais bem utilizadas nas escolas. (...) o secretário da educação (...) inclusive analisará se diminuirá o número de exames deixando, por exemplo, de participar da avaliação federal ou extinguindo a Prova São Paulo”.

Apesar dos cinqüenta anos de intervalo, que coincidência existe nas duas matérias? Segundo meu ponto de vista, ambas propõem soluções para aspectos meramente secundários de um problema extremamente grave. Tanto lá como cá, os alunos não aprendem e os resultados mostram isso. Mas as soluções indicadas, ao invés de procurar sanar esse ponto central, propõem aumentar o número de disciplinas para a antiga 2ª época ou diminuir o número de exames!

A história nos mostra que os resultados da política educacional de 1963 continuaram sendo pouco satisfatórios ao longo das décadas seguintes. Isso porque as medidas propostas para melhoria da qualidade da educação brasileira continuaram sendo, em sua expressiva maioria, simples retoques em aspectos secundários. Quando voltadas para pontos importantes do sistema educacional (como algumas disposições da Lei de Diretrizes e Bases de 1996), ou foram distorcidas ao serem implantadas ou nem foram ainda colocadas em prática.
Um exemplo? Muitos alunos de nossas escolas concluem o ensino fundamental sem as competências de leitura necessárias para aprendizagem de conhecimentos nos vários campos da ciência e das artes. Resultado lastimável! E sabemos que há tantos outros exemplos...

A esperança: quem sabe a nova gestão paulistana não limite sua política educacional a questões secundárias dos muitos problemas de avaliação institucional hoje presentes no sistema educacional de São Paulo. A conferir nos próximos quatro anos!

8 comentários:

  1. Carlos Luiz,
    Em relação à Matemática, tema que tenho aprofundado meus estudos, há inúmeros e complexos aspectos que têm contribuído para o baixo desempenho dos alunos...e que têm passado à margem das discussões políticas.
    Um desses aspectos, que pode ser tomado como exemplo, diz respeito à generalidade das propostas curriculares nacionais: que descoladas dos marcos teóricos que as fundamentam; e pautadas, quase que exclusivamente, na descrição de competências, contribuem para que haja um esvaziamento dessas propostas em relação aos conceitos e conteúdos matemáticos que precisam ser ensinados...lacuna esta, bem sabemos, que não tem sido enfrentada pelos cursos de formação inicial e continuada.
    Há grande empenho no ensino daquilo que compõe o "como ensinar", mas o mesmo não se verifica em relação ao "o quê ensinar" e ao “por que ensinar”...faltam os fundamentos...
    Em Portugal, Maria Helena Damião (da Universidade de Coimbra) tem apontado os efeitos negativos das propostas curriculares pautadas apenas e tão somente na descrição de competências, sem a devida estruturação vertical daquilo que deve ser ensinado... vale a pena ler seus artigos...
    Um grande abraço e um excelente 2013!!

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    1. Realmente, Karina, suas reflexões são extremamente importantes e penso que convergem para a necessidade de rever e repensar os aspectos que considero essenciais na política educacional, seja em nível de sistemas seja em nível das escolas. Enfim, um esforço necessário para o qual estamos todos "convocados", concorda?
      Grande abraço e desejo um ano com muitas conquistas.

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  2. Infelizmente é esta a realidade da Educação no nosso país, é chegado o momento de reinventar, reencantar, ou seja, hora de transformar...

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    1. É isso mesmo, colega. Seguindo as orientações e estímulos do nosso grande mestre Paulo Freire - reencantar!
      Grande abraço e obrigado pela contribuição.

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    2. Perfeita sua análise,professor,enquato as medidas Educacionais, tanto do âmbito Público,quanto do Institucional forem tomadas,não só de forma secundária,mas olhando para os alunos e professores como todos iguais,ou o que é pior, (exclui-los,sem um trabalho apropriado) com o objetivo de que todos se tornem "iguais",não teremos transformações eficazes na educação.
      Abraços saudosos,

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    3. É isso mesmo, amiga e colega Rosely, você tem razão. Nossa esperança é a mudança na política educacional, em nível de governo e de cada escola. Quem sabe ainda assistiremos a essa renovação, não é mesmo?
      Grande abraço.

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  3. Eu vejo que toda essa questão aponta também para políticas que apenas preservam o "nivelamento por baixo", ou seja, definem (pelo menos nas escolas estaduais) o mínimo do que o aluno precisa saber e nada mais. Não existe, como a Karina apontou, uma visão vertical que permita a evolução deste aluno em seu conhecimento. Busca-se sempre o mínimo, porque as avaliações externas cobram o mínimo. O problema é que nem este mínimo tem sido alcançado. Não basta olhar só para os resultados, é preciso que se repense o processo em busca de novos horizontes, novas possibilidades. E nós, professores, não podemos nos contentar e nos acomodar com este mínimo.
    Roberta

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    1. É mesmo, Roberta, não podemos nos contentar e nos acomodar com esse e com qualquer outro mínimo. Eu penso que conhecer claramente o mínimo do currículo ao qual TODOS OS ALUNOS, sem faltar nenhum, têm direito de alcançar é um componente importante. Mas, totalmente insuficiente. Concordo com você: é necessário também formular o caminho da evolução. E as provas para avaliar resultados são recursos necessários, mas também insuficientes. Repensar o processo, como diz você, é igualmente urgente.

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