terça-feira, 23 de agosto de 2011

PROFESSORES SOLITÁRIOS, PROFESSORES SOLIDÁRIOS

Um dos comentários postados no texto “O atirador de Oslo” chamou minha atenção: a nossa colega Karina faz diversas perguntas muito importantes, segundo penso. Gosto muito disso – idéias são expostas para provocar outras questões e ampliar o debate e as reflexões.

Duas perguntas em especial me atraíram para um novo texto:
“Como transformar o trabalho docente, muitas vezes solitário, em situações que sejam mais solidárias?”
“Como um professor solitário pode oferecer uma proposta solidária?”

Realmente, muitas vezes nosso trabalho docente é solitário. E, em determinadas circunstâncias, isso é muito benéfico. Há momentos nos quais somente o professor e seus alunos efetivamente contam para alcançar o principal objetivo escolar: realizar e consolidar as aprendizagens. Quem já não sentiu o prazer de viver esses momentos “íntimos” com os alunos e constatar como eles provocaram conquistas e avanços?
No entanto, essa solidão corre o risco de gerar insegurança e perplexidade, se desacompanhada da solidariedade. A situação de professor solitário inseguro é superada quando a docência é compartilhada. Sozinhos e isolados, temos poucas chances de cumprir efetivamente nossa tarefa social de educar.

A construção da solidariedade está intimamente ligada ao trabalho coletivo dos educadores: estamos solidários ao elaborar o projeto pedagógico da escola, os planos didáticos e os planos de gestão; continuamos integrados ao ministrar nossas aulas e trocar informações sobre os alunos; aprofundamos nossos laços ao avaliar o desenvolvimento e o crescimento deles, o nosso e o da escola. Repare: no início do parágrafo, usei o verbo “estamos” e não “somos”! De propósito. Pois sei que a solidariedade é um MOVIMENTO e não um modo estático de relacionar-se.

A solidariedade-movimento consiste em tomar decisões e desenvolver ações coletivamente, mediante acordos entre todos os participantes sobre os diversos aspectos da estrutura e do funcionamento da escola. Acordos que, pela própria natureza dos processos educacionais, têm a característica de serem provisórios. Isso porque a situação social na qual estamos imersos está em constante mudança. O que hoje é válido, amanhã poderá precisar de revisões e modificações.

Esse movimento de equilibrar a solidão com a solidariedade no exercício da docência depende, dentre outros fatores, da forma como os diretores, coordenadores e orientadores exercem suas funções de gestão. Uma incumbência importante é a de liderar e incentivar um trabalho coletivo direcionado para a construção dos acordos. Ou, em outras palavras: identificar os aspectos comuns e os divergentes nos diferentes pontos de vista de todos participantes da escola. Em relação aos comuns, promover as análises necessárias para reforçá-los, quando alinhados ao projeto pedagógico da escola. Quando divergentes, incentivar as reflexões coletivas para incorporar suas contribuições, se consideradas pertinentes à cultura institucional e ao seu permanente aperfeiçoamento.
Enfim, professores solitários e, ao mesmo tempo, solidários. Como espero ter mostrado, não se trata apenas de uma troca de letras...

terça-feira, 9 de agosto de 2011

O atirador de Oslo: o poder das convicções

“Uma pessoa com convicção tem a força equivalente a 100 mil que tenham interesses apenas.”

Anders Behring Breivik, o atirador de Oslo, é o autor da frase. Uma ideia avassaladora, especialmente para as mais de setenta pessoas mortas nos dois atentados e seus familiares, amigos e conterrâneos.
Mas, ao mesmo tempo, uma ideia fundamental para quem escolheu as muitas profissões de educar. Como são formadas as convicções? Como crianças e jovens podem ser orientados para escolhê-las? Ou será que nós - pais, professores, coordenadores, orientadores, diretores - não temos possibilidades de influir nas opções deles?
Eu acredito profundamente que podemos contribuir decisivamente para a formação das convicções em nossas crianças e jovens. Aliás, acho até que essa é uma das principais missões dos educadores, seja na família, seja na escola básica. E adoto esse ponto de vista porque sei quando e como a maior parte das convicções é construída pelo ser humano. Essa minha posição decorre das experiências vividas na companhia de meus dois filhos, três netos e tantos alunos com quem tenho convivido há quase cinqüenta anos e das contribuições dos diversos autores que estudei.
Resumidamente: desde muito cedo, vão sendo lançados os fundamentos de grande parcela das convicções assumidas por nós, na vida adulta. Isso torna as ações, as palavras e, especialmente, os exemplos dos educadores uma fonte extremamente importante para as crianças e jovens. É na convivência quotidiana com seus pais, seus professores e seus dirigentes escolares que eles podem vivenciar situações concretas de construção de suas convicções.
É certo que a sociedade mais ampla – os meios de comunicação, a igreja, a política, a economia, para citar alguns exemplos – também exercem poderosa influência nessa construção. É certo ainda que os caminhos percorridos ao longo da vida podem confirmar ou modificar convicções. Mas, é inegável que a família e a escola básica têm marcas profundas nesse processo.
Dirijo-me particularmente aos professores e dirigentes das nossas escolas de educação infantil, ensino fundamental e médio para reforçar o que costumeiramente tenho defendido em meus escritos e em minha atuação de gestor escolar: temos que aproveitar todas as oportunidades para incentivar nossas crianças e jovens para assumirem ideias e posturas de respeito às diversidades, de aceitação de culturas desenvolvidas por outros seres humanos e de privilegiar o coletivo e o bem comum. Não é por acaso que o atirador de Oslo despreza o multiculturalismo, as sociedades pluralistas e a democracia, conforme ele mesmo confessa nos manifestos postados na internet.
Precisamos criar e desenvolver projetos pedagógicos e curriculares que concorram poderosamente para a formação de convicções condizentes com uma civilização pacífica, tolerante e sustentável. As proposições de escola inclusiva e educação multicultural podem ser instrumentos eficientes para esse empreendimento cidadão.
Mas, acima de tudo, precisamos nos comprometer com essa missão por meio de exemplos, mais do que por palavras e discursos. As inúmeras ocorrências e acontecimentos em um só dia de uma escola – nós sabemos bem – propiciam oportunidades preciosas para oferecer aos nossos alunos essas vivências. O que se poderá conquistar nos 15 ou 16 anos durante os quais eles podem permanecer conosco na escola básica! (Digo “podem”, porque, infelizmente, são muitos aqueles a quem é negado esse direito fundamental de cidadania...)
Carlos Luiz Gonçalves, em julho de 2011.